domingo, 6 de maio de 2012


RECOMPENSAS: A REVOLUÇÃO

Em meados da década de 1990 o mercado estava particularmente eufórico com os novos augouros da estabilização econômica no Brasil, especialmente a partir do êxito do Plano Real de 1994, após as inúmeras tentativas que lhe antecederam sem sucesso.
O segmento de cartões, seguramente, foi dos que mais celebraram o alvorecer de uma nova era de estabilidade, inédita e essencial para o desenvolvimento do negócio no país.
Foi um período de grande euforia e muita movimentação: um novo mercado estava literalmente nascendo e parecia haver sido dada a largada para uma nova corrida do ouro.
Um dos primeiros grandes movimentos que inudaram o mercado foram os cartões de afinidade. Havia de todos os tipos, cores e matizes: times de futebol, clubes, associações beneficientes, entidades em busca de recursos provenientes do novo maná, o cartão de crédito, que haveria de produzir, com imaginosa expectativa de abastança, lucros e resultados mais do que suficientes para suprir, com folga, todas as necessidades das novas parceiras, desde reforma de suas sedes sociais, construção de ginásios, ampliação de estrutura de seus espaços assistenciais etc, etc.
Não tardou muito para que vissemos que a conta não fechava. E que nem tão pouco os clientes estavam tão entusiasmados quanto o previsto com os novos programas: preferiam benefícios e recompensas diretamente para seus bolsos – e não para os caixas de seus clubes ou entidades beneficientes.

A onda dos cartões de afinidade rapidamente migrou para os cartões co-branded. A quinstessência da fórmula de atratividade dos cartões, entregava aos clientes diretamente os benefícios resultantes da parceria. Dentre inúmeras alternativas nos mais diversos segmentos desde automóveis, linhas aéreas e supermercados, as milhas aéraes rapidamentes se provaram o benefício mais desejado e cobiçado.
Estamos falando de quase 20 anos atrás, pelos idos de 1995 e 1996, quando surgiram os mais bem sucedidos modelos de cartões de marcas compartilhadas, como o United Airlines BankBoston, o Varig do Banco Nacional e o American Airlines da Credicard.
Tempos em que as milhas ressoavam como poesia, um encontro aparentemente perfeito e inigualável de diferencial e vantagem competitiva de mercado para os cartões. E os números não deixavem dúvidas: os cartões com maiores índices de ativação e uso – e os menores níveis de cancelamento – eram, invariavelmente, os co-branded das companhias aéreas.
Não tardou a que todo o mercado viesse a ser inundado por milhas, já não mais ou apenas no formato co-branded, mas no modelo de aquisição de milhagem como forma de recompensa, independente de associação de marca com companhias aéreas específicas.
Nesse momento, o que era diferencial passou a ser praxe e surgiu um novo negócio no mercado: o negócio de venda de pontos. Primeiro milhas, depois pontos para virtualmente tudo e qualquer coisa: ingrressos de cinema, descontos em equipamentos eletrônicos, livros, CDs, hospedagens,  programas de seguros até, mais recentemente, compras coletivas.
A rapidez da evolução
foi tal e tamanha que todos os modelos correram para reunir todas as trocas possíveis ao mesmo tempo, de tal modo que praticamente todos têm as mesmas vantagens e benefícios – e ninguém mais tem um diferencial.
O que era vantagem competitiva tornou-se componente da linha de produção. Ganhou quem soube aproveitar a corrida por compra de pontos e milhas (notadamente as unidades de negócios de milhagem das companhias aéreas) e perderam as administradoras de cartões que, de um dia para o outro, passaram a estar obrigadas a oferecer as mesmas vantagens que haviam inundado o mercado, não mais para se diferenciar, mas tão somente para não ficar para trás.
Em grande medida também porque, é bom que se diga, o que era para ser um programa de nicho, segmentado e dirgido mercadologicamente a um público específico (viajantes frequentes), pasou a ser a nova panacéia, o elixir mágico esparramado para todos e por todo o mercado – mais um erro da falta de estratégias segmentadas de marketing em nossa indústria.
O resultado? Programas de recompensas que pesam drasticamente no orçamento dos Emissores de cartões (dados do Bacen do final de 2010 apontavam para quase R$ 1 bilhão de gastos efetivos dos Emissores com recompensas e um estoque total de pontos próximo a R$ 6 bilhões)  – e que já não funcionam como diferencial de valor agregado suficiente para garantir aumento de uso e fidelização dos clientes.
Para agravar o desafio, Bancos e Emissores hoje estão focados em melhores resultados e incremento de margens e de lucro. Não há mais espaço para experimentação e investimentos de resultados duvidosos. Qual o retorno dos investimentos em milhagens e recompensas, já incorporados no orçamento de todos os cartões?
Iniciativas internacionais apontam para uma nova tendência, ainda não provada por aqui, mas que certamente terá o seu momento de discussão: para ativar o programa de recompensas, o cliente deverá pagar uma anuidade pelo cartão. Os cartões que não pagam anuidade não farão jus a recompensas. Iniciativas a propósito estão em marcha (como o Citi Simplicity, do Citibank e o novo produto com baixo custo, mas sem recompensas, do Barclays, do Reino Unido).
Nessa mesma direção apontam os resultados de uma recente pesquisa realizada aqui no Brasil pela CVA Solutions, com cerca de 7.000 portadores de cartões (cada entrevistado com 2,2 cartões, em média) em fevereiro: entre estar isento de custos e ter acesso a algum programa de recompensas, o portador de cartão por aqui fica com a primeira: abre mão da milhagem para não ter que pagar anuidade do cartão, por exemplo.
O que dificilmente será sustentável no tempo é o modelo atual de recompensas e milhagens para todos os cartões e todos os clientes, a custos incandescentes  e em incrível trajetória ascendente, que já não garantem os resultados dos cartões na mesma proporção da majoração de seus custos.
Um exemplo de como o mercado deverá se comportar: um inovador programa de troca de pontos por minutagem de telefonia celular pré-paga. Com custos surpreendentemente mais econômicos, a troca de pontos do cartão por minutos pode ser uma excelente alternativa de recompensas, tangível e de facílimo entendimento para os clientes – e muito mais econômica para os Emissores.
Por enquanto, poderá ser um ótimo diferencial competitivo. Na linha do tempo, quando mais e mais Emissores passarem a adotar alternativas como essa, os custos atuais das recompensas serão necessariamente pressionados para baixo.
Em paralelo, um processo de segmentação de benefícios, a exemplo das diversas segmentações de produtos já existentes, deverá fazer com que as recompensas sejam mais assertivamente dirigidas aos clientes de acordo com o perfil de cada um: não faz nenhum sentido a oferta de milhas aéreas para clientes cujos gastos, limitados por suas prórprias linhas de crédito,  por exemplo, não conseguem somar nem um trecho de ida na ponte aérea.
Os tempos são bem outros e, no outrora reluzente universo das recompensas, o que deveria ser uma vantagem competitiva, passou a ser um encargo compulsório para muitos Bancos: uma revolução, por custos mais racioniais e novos diferenciais capazes de produzir vantagens competitivas concretas, está em marcha.
O modelo atual, no formato e nos custos presentes, assim como os cartões afinities de 20 anos atrás, não atende mais a seus propósitos:  resultado e rentabilidade estão em jogo - e nessa arena os Bancos e Emissores não costumam brincar.

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