AINDA O CADASTRO
POSITIVO
Situada
no centro do processo de amadurecimento do crédito e do crescimento econômico,
a construção do cadastro positivo tem sido uma obra amplamente discutida,
debatida e aguardada. Mais do que tudo, aguardada.
Após
a aprovação da regulamentação, após intensos debates e enfrentamentos, em 10 de
Junho de 2011 pela Presidência da República, o projeto ainda não decolou.
A
retomada das discussões sobre o tema neste momento reveste-se da maior
oportunidade e relevância, tendo em conta o novo – e definitivo – contexto de
redução das taxas de juros em acelerada marcha no mercado financeiro.
Um
pouco de retrospecto pode auxiliar no dimensionamento da importância do
tema.
O
cadastro positivo, ao contrário de nossa tradição “restritiva”, funciona como
um longa metragem onde se desenvolve a vida financeira do cidadão. Bem ao
contrário do processo do cadstro restritivo, que funciona como uma espécie de
flash de radar de rodovia, quando um veículo ultrapassa o limite de velocidade.
Assim,
não importa se o motorista que excedeu em 5% o limite de velocidade e durante
10 anos sempre teve conduta exemplar. O radar lançará a multa por força daquele
único episódio desabonador.
Na
tradição brasileira de apontamentos restritivos de crédito, é isso o que
acontece: o mercado visualiza aquele episódio desabonador, visualiza a multa. O
histórico do condutor – há quanto tempo dirige, quanto trafega por mês, quantas
renovações bonificadas obteve em seu seguro por ausência de sinistros etc –
nada disso existe no universo oficial do cadastro restritivo.
Apenas
aquela multa, único desvio momentâneo em sua vida de motorista. Mas,
transportando o conceito, por esse critério, caso a carteira de motorista fosse
um contrato de crédito, esse cidadão não poderia ter sua carteira de motorista
renovada.
No
longa metragem do cadastro positivo, ao contrário, toda a história de direção
segura, bonificação de seguros e condução disciplinada estaria gravada e
valorada no momento da renovação da carta – ou, transportando para o nosso
contexto – a concessão do crédito.
Por
que é tão importante esse longa metragem?
Porque
através dele as instituições financeiras conseguem determinar a quantidade de
crédito que um cliente pode receber com segurança. O valor e o preço do
empréstimo que cada cliente pode receber e terá condições saudáveis de pagar,
sem comprometer sua própria saúde financeira e sem gerar risco grave de não
pagamento.
De
posse dessa ferramenta, o mercado financeiro pode melhorar a qualidade do
crédito ofertado. Em poucas palavras: pode corroborar e acelerar a redução das
taxas de juros.
Muito
além de polarizações políticas ou ideológicas, acerta a economia que consegue
trabalhar saudavelmente com taxas de juros menores. Desde que devidamente
atribuídas aos clientes, respeitados os critérios de capacidade de pagamento
versus risco de crédito.
Não
é excessivo agregar que, no primeiro trimestre de 2012, o volume de aprovação
de crédito para aquisição de veículos passou a 50% do total das solicitações,
despencando de 70% do ano anterior, porque a conta da inadimplência pesou muito
acima do esperado no final de 2011.
Não
existe mágica. Se a instituição financeira não consegue ter a segurança e a
garantia necessária ao crédito, não haverá crédito.
Outra
vez: o movimento de redução de taxas de juros (a essa altura já não apenas
tendência, mas movimento efetivamente em marcha) é, sobre todos os aspectos,
louvável e desejável.
Mas
as condições de viabilidade devem estar presentes. Ou o debate atual, de resto
bem intencionado, não passará de bravata.
Dentre
essas condições, reassume decisiva relevância o cadastro positivo. Conhecer os
clientes e ter acesso a seu comportamento e histórico de pagamentos é
fundamental para a concessão madura – e de menor risco – de crédito.
Não
por acaso em economias que adotam o produto o volume de crédito é superior a
100% do PIB – e por aqui ainda 49%, que hoje celebramos, porque há cinco anos o
volume era ainda metade desse.
Crescemos
e evoluímos em praticamente todos os indicadores econômico-sociais, incluindo
os de utilização de crédito. Mas ainda há um longo e respeitável caminho a
percorrer. De resto, todo o mundo já percebeu isso e está chegando por aqui,
com inédito apetite de negócios, à espreita e na aposta de que saberemos dar os
próximos saltos qualitativos na consolidação de uma economia moderna e madura.
Parte
disso é, sem dúvida, o desencalhe do cadastro positivo. O debate sempre
subjacente durante a formulação regulatória, entre o interesse público
(expansão do crédito) e os limites da privacidade (sigilo das informações) deve
agora passar ao próximo nível.
Com
maturidade e seriedade, não será difícil entender que o compartilhamento de
informações beneficiará a todos e sobretudo aos próprios cidadãos, que serão
premiados com melhores produtos e serviços, melhores ofertas e menores taxas de
juros.
Os
agentes e a habilidade técnica para gerir e desenvolver esse negócio já estão a
postos – e confiantes. Talvez ainda não nos tenhamos dado conta, mas o único
país em que os 3 maiores bureaus de crédito do mundo – Experian (Serasa),
Equifax (que, em associação com a Associação Comercial de São Paulo originou o
grupo Boa Vista) e TransUnion (que recém aportou no país com a aquisição da
Crivo), estão presentes, além do seu país de origem, os Estados Unidos.
Pode
parecer pouco, mas não é. O mercado e os cidadãos estão confiantes. É hora de
desatar os nós e ingressar, de uma vez, no primeiro mundo da economia.
Menos
radares amoitados na beira da estrada.
No crédito, como na política e na vida: honestidade, franqueza e
transparência – nossa história não pode ser o resultado de um flash fortuito de
radar: temos um longa metragem a
apresentar.
Nenhum comentário:
Postar um comentário