sexta-feira, 25 de maio de 2012


IN OMNIA RESPICE FINEM

O estupendo avanço da tecnologia parece determinar os rumos e os destinos do mundo dos negócios, assim como,  de resto, o de nossas vidas pessoais e particulares.

Os temas candentes de todos os veículos, mídias e debates são invariavelmente centrados em avanços e sofisticações de ferramentas de tecnologia. Como se o mundo se resumisse a uma gigantesca Apple Store ou a uma interminável projeção do Facebook.


Nos meios de pagamento, as inovações tecnológicas (NFC, contactless, proximity etc), são a pauta das publicações especializadas.


Nenhum problema, a não ser quando se começa a perder a noção da relação necessariamente instrumental da tecnologia. 


Necessariamente ferramenta, meio e instrumento: jamais fim em si mesma.


Não me parece exagerado afirmar que muitas vezes estamos perdendo essa conexão essencial de meio e fim, de ferramenta e objetivo. Não raras vezes encontramos “soluções a busca de um problema”, quando já não temos poucos problemas e desafios concretos e emergentes demandando soluções reais. Que, nem sempre, aliás, por insano que pareça, pertencem ao escopo da tecnologia...


O tema não é novo. Mas assume proporções preocupantes atualmente.


Há mais de 20 anos, o mercado de tecnologia da informação e DBM, por exemplo, deslumbrava-se com uma das maravilhas da então novíssima tecnologia de inteligência de dados, com ferramentas sofisticadas e complexas que seriam capazes de dizer e predizer comportamentos, perfis, hábitos, propensão a compra, propensão a perda e, se duvidassemos, até prediriam a quantidade de dinheiro que a empresa ganharia (ou perderia) com cada cliente.
Bancos e financeiras acudiram à ferramenta, caríssima, como se corressem ao encontro do santo graal. 


A geração X vai se lembrar exatamente desse período (e dessa ferramenta) e a geração Y pode “fazer um ‘Google’” e descobrir do que estamos tratando. Fato é que até hoje o potentíssimo sistema de gestão de dados da Harte & Hanks não foi jamais aproveitado em sua inteira capacidade e não raros são os casos de quase inteira obsolescência por absoluta falta de habilitação de usuários e de matéria prima (leia-se dados) para devidamente alimentá-lo.  Bônus dobrado para quem comprovar que conseguiu extrair a plena potencialidade da ferramenta.


E, nada obstante, investimentos de monta foram empenhados por muita gente, que até hoje ficou esperando pelo retorno.


Ferramentas funcionam para resolver problemas. Para faciliar as dificuldades. São simplesmente péssimas quando trazem mais dificuldade para gerí-las e quando demandam mais esforço, investimentos e atenção do que o esforço causado pelo problema que pretendem solucionar. Porque subvertem o seu escopo e a sua, por assim dizer, “função social” de faciliar e resolver problemas, tornando-se maiores e mais relevantes do que eles próprios. É como se houvessemos esquecido de responder, essencialmente: qual a sua finalidade, o seu sentido, a que elas servem?


A questão tem inúmeros desdobramentos e consequências, que vão bem além da teoria.


Uma das implicações recorrentes dessa distorção é a falta de flexibilidade para o atendimento das demandas e problemas concretos e específicos de cada cliente (ou ao menos grupos de clientes) presente na larga maioria de nossos sistemas corporativos. 


Porque, desde sua gênese e concepção, faltou o ingrediente rudimentar - e a cada dia mais decisivo, do foco cliente.


Outra implicação é o mal dimensionamento – e consequente obsolescência – das ferramentas. Muitas vezes a ferramenta, por se considerar fim em si mesma, é muito mais complexa do que a real necessidade demandada pelo problema. Como consequência, será mais onerosa e, no final do dia, não será utilizada em sua totalidade, tornado-a obsoleta.


Mais, a inversão de ordem definitavemente instalou-se em nossas vidas pessoais. Quando deveria ser um facilitador do trabalho, encurtando e abreviando distâncias  e, consequentemente, poupando tempo para a vida pessoal, familiar e a então sonhada qualidade de vida, hoje a acachapante prevalência das ferramentas de comunicação instantânea desde o berço (literalmente) tornou-se escravizante. Antes de se tornar o éden da tranquilidade pela comodidade que proporciona, tornou-se a alquimia do stress e da neurose constante e permanente da hiperconexão.


Culpa da tecnologia? Claro que não. Culpa nossa, dos usuários que, enebriados pelas genialidades contagiantes de nossas invenções, rendemo-nos a elas, criando monstros que não conseguimos gerenciar e administrar. Voltaremos ao tema.


Já passou da hora de retornarmos às raízes para entender e atentar às razões e finalidades do que fazemos e pelas quais trabalhamos. 


Do outro lado do balcão, estará sempre o cliente, de onde jamais deveriamos haver retirado nosso foco.


E no final de cada mês, trimestre e ano, os acionistas estarão esperando pelos resultados do negócio. Mal parafraseando a frase, hoje repetida como mantra “é a inovação, estúpido!” (derivada da vitoriosa campanha de Bill Clinton nas eleições presidenciais de 1992: “It´s the economy, stupid”), cuidado: não são as ferramentas, mas os clientes e os resultados que importam, estúpido! Menos ferramentas – e mais inteligência.


In omnia respice finem é uma expressão do latim, aqui utilizada de caso pensado e a propóstio, como signo e referência que remete necessariamente às raízes e essência de nossa cultura e que quer dizer (desde há muitos séculos): “em todas as coisas, respeite a sua respectiva finalidade”...  Onde foi que começamos a nos perder?

domingo, 6 de maio de 2012


A NOVA LIDERANÇA 

Dificilmente haverá um ponto de equidistância e equilíbrio absolutos na relação empresa – funcionário, ou empregado – empregador, pela simples razão de que, embora a relação de interdependência seja óbvia, quem decide, ao fim e ao cabo, é quem tem o poder de contratar – e descontratar.
No entanto, essa gangorra tenderá mais ao centro sempre e quando a oferta de emprego crescer e na medida e proporção exatas da estabilização econômica e do desenvolvimento social. Quanto melhor andar a economia, mais equilibrada será essa relação.
Porque em um contexto econômico-social de maior desenvolvimento e estabilidade, chegamos próximos do ideal do “pleno emprego”, ou seja, o estágio em que há grande oferta de trabalho – na esteira do crescimento econômico – e, consequentemente, menores índices de desemprego.
É o reverso do que está acontecendo na Europa, habituada ao estado de bem estar social (o welfare state, decantado como ideário de uma sociedade com alto grau de maturidade econômica), que não está mais resistindo ao peso e ao custo social insuportável de uma população que não se renovou – poucos produzem para alimentar o Estado, que por sua vez sustenta cada vez mais e mais indivíduos, cujos direitos sociais garantiam, durante anos, que não precisariam mais produzir.
O resultado hoje na Eurozona é um desemprego beirando a taxa de 11% (só na Espanha, o caso mais crítico, já chegou a 24%), em um total de mais de 17 milhões de desempregados.
No Brasil desta até outrora improvável década, em que parecem finalmente haver soprado os ventos do desenvolvimento, estamos entrando em um período, senão ainda de “pleno emprego”, sem dúvida de muito menor desemprego e muito maiores oportunidades de trabalho. Em contraste com a declinante economia européia, o desemprego por aqui fechou 2011 em 6% (em ritmo de queda constante e consistente desde 2003, quando o índice era de 12,3%).
Há, inclusive, excesso de oferta em muitos casos, que não conseguem preencher novos postos de trabalho por falta de qualificação (engenheiros de todas as especialidades estão sendo importados para ocupar os novos postos de trabalho criados no país...).
Em um cenário de mais oferta de empregos, ganha força a mão de obra qualificada, em especial e, em geral, o trabalhador, que tem mais alternativas e que, portanto, pode trocar de posto de trabalho quando não mais lhe convier o atual.
Muito interessante, nesse compasso, observar que, além do quadro econômico favorável, a nova geração (a geração Y), é muito mais rápida e volátil em suas decisões profissionais, acelerando mudanças sempre que não estiver satisfeita em um determinado ambiente de trabalho. A antiga fidelidade da geração anterior, está sendo revista pelos Y, que têm menos tolerância e paciência com experiências que não sejam compensatórias e satisfativas em sua trajetória profissional.
Contexto econômico favorável e uma geração mais agressiva formam um novo modelo de profissional que, no mínimo, vai exigir muito mais atenção, consideração e dedicação das lideranças corporativas.
Sorte dos bons gestores e das empresas efetivamente empenhadas na valorização e realização de seus empregados. Azar dos que precisam ainda se valer da hierarquia e do peso do crachá para estabelecer seu padrão de conduta e autoridade.
Perdeu, playboy!
Durante muito tempo, empresas e gestores puderem se escudar na fragilidade da economia e na carência de postos de trabalho para desdenhar da atenção e valorização do ativo humano de seus negócios, com a confiança velada de que, afinal, todos os funcionários “precisam desse emprego” e, portanto, não importa muito o que fizermos ou deixarmos de fazer, eles não podem abandonar a empresa...
Essa perversa equação, tão inteiramente verdadeira que muitos “líderes” chegam a verbalizá-la (“eles precisam desse emprego...”) é tanto mais prevalente quanto mais frágil for a economia e mais instáveis forem as oportunidades de emprego. Bem ao contrário, é bem de ver, do cenário em que o Brasil está agora adentrando.
A nova liderança que se faz necessária para esses novos tempos é inspiracional, não autoritária. É baseada no exemplo, na postura, na atitude e no encorajamento pessoal de cada um dos membros da equipe de trabalho.
A cada vez mais, as organizações terão perfil mais horizontal e mais matricial e menos vertical. A figura do chefe vai cedendo lugar à do líder, que tem a habilidade de congregar e conduzir grupos diferentes e multidisciplinares de trabalho, fazendo primeiro – mostra o caminho, trilhando-o primeiro.
Por outro lado, a pergunta recorrente dos grupos de trabalho “what´s in there for me” não poderá mais ser desprezada: cada empregado quer e tem todo o direito de saber qual a recompensa (seja diretamente financeira, em forma de bônus ou aumento salarial, seja em forma de progressão funcional, seja em forma de novos projetos e responsabilidades, seja até na forma de um simples gesto de gratidão e reconhecimento da empresa, não importa) e qual a motivação para a realização de determinada tarefa.
A saída fácil de ordenar porque simplesmente o empregado tem o dever de obediência hierárquica, não vai mais funcionar. Porque, se o funcionário não estiver satisfeito com as respostas (ou falta delas), com os princípios e com os rumos do projeto ou da empresa, em um cenário de pleno emprego, simplesmente vai embora. É a inversão do ônus: cabe ao líder mostrar e convencer ao empregado que vale à pena ficar – e produzir com qualidade, junto ao grupo de trabalho.
Há certas coisas que acabam funcionando quando submetidas a pressão. Pois agora a pressão estará toda sobre as lideranças e os gestores, submetidos ao escrutínio diário da aprovação de seus liderados, aferida sob duas medidas: o incremento da produtividade e dos resultados e a fidelidade de seu grupo de trabalho.
E as duas medidas anda muito mais juntas do que parece: quem fica, é porque está feliz (os incomodados, literalmente, haverão de se mudar, com mais facilidade do que nunca) – e quem está feliz produz mais e melhor.
Simples assim. Em um novo conceito de gestão, ao mesmo tempo, o desafio e o bônus do novo líder:  provocar - e sustentar - o círculo virtuoso da felicidade produtiva.

RECOMPENSAS: A REVOLUÇÃO

Em meados da década de 1990 o mercado estava particularmente eufórico com os novos augouros da estabilização econômica no Brasil, especialmente a partir do êxito do Plano Real de 1994, após as inúmeras tentativas que lhe antecederam sem sucesso.
O segmento de cartões, seguramente, foi dos que mais celebraram o alvorecer de uma nova era de estabilidade, inédita e essencial para o desenvolvimento do negócio no país.
Foi um período de grande euforia e muita movimentação: um novo mercado estava literalmente nascendo e parecia haver sido dada a largada para uma nova corrida do ouro.
Um dos primeiros grandes movimentos que inudaram o mercado foram os cartões de afinidade. Havia de todos os tipos, cores e matizes: times de futebol, clubes, associações beneficientes, entidades em busca de recursos provenientes do novo maná, o cartão de crédito, que haveria de produzir, com imaginosa expectativa de abastança, lucros e resultados mais do que suficientes para suprir, com folga, todas as necessidades das novas parceiras, desde reforma de suas sedes sociais, construção de ginásios, ampliação de estrutura de seus espaços assistenciais etc, etc.
Não tardou muito para que vissemos que a conta não fechava. E que nem tão pouco os clientes estavam tão entusiasmados quanto o previsto com os novos programas: preferiam benefícios e recompensas diretamente para seus bolsos – e não para os caixas de seus clubes ou entidades beneficientes.

A onda dos cartões de afinidade rapidamente migrou para os cartões co-branded. A quinstessência da fórmula de atratividade dos cartões, entregava aos clientes diretamente os benefícios resultantes da parceria. Dentre inúmeras alternativas nos mais diversos segmentos desde automóveis, linhas aéreas e supermercados, as milhas aéraes rapidamentes se provaram o benefício mais desejado e cobiçado.
Estamos falando de quase 20 anos atrás, pelos idos de 1995 e 1996, quando surgiram os mais bem sucedidos modelos de cartões de marcas compartilhadas, como o United Airlines BankBoston, o Varig do Banco Nacional e o American Airlines da Credicard.
Tempos em que as milhas ressoavam como poesia, um encontro aparentemente perfeito e inigualável de diferencial e vantagem competitiva de mercado para os cartões. E os números não deixavem dúvidas: os cartões com maiores índices de ativação e uso – e os menores níveis de cancelamento – eram, invariavelmente, os co-branded das companhias aéreas.
Não tardou a que todo o mercado viesse a ser inundado por milhas, já não mais ou apenas no formato co-branded, mas no modelo de aquisição de milhagem como forma de recompensa, independente de associação de marca com companhias aéreas específicas.
Nesse momento, o que era diferencial passou a ser praxe e surgiu um novo negócio no mercado: o negócio de venda de pontos. Primeiro milhas, depois pontos para virtualmente tudo e qualquer coisa: ingrressos de cinema, descontos em equipamentos eletrônicos, livros, CDs, hospedagens,  programas de seguros até, mais recentemente, compras coletivas.
A rapidez da evolução
foi tal e tamanha que todos os modelos correram para reunir todas as trocas possíveis ao mesmo tempo, de tal modo que praticamente todos têm as mesmas vantagens e benefícios – e ninguém mais tem um diferencial.
O que era vantagem competitiva tornou-se componente da linha de produção. Ganhou quem soube aproveitar a corrida por compra de pontos e milhas (notadamente as unidades de negócios de milhagem das companhias aéreas) e perderam as administradoras de cartões que, de um dia para o outro, passaram a estar obrigadas a oferecer as mesmas vantagens que haviam inundado o mercado, não mais para se diferenciar, mas tão somente para não ficar para trás.
Em grande medida também porque, é bom que se diga, o que era para ser um programa de nicho, segmentado e dirgido mercadologicamente a um público específico (viajantes frequentes), pasou a ser a nova panacéia, o elixir mágico esparramado para todos e por todo o mercado – mais um erro da falta de estratégias segmentadas de marketing em nossa indústria.
O resultado? Programas de recompensas que pesam drasticamente no orçamento dos Emissores de cartões (dados do Bacen do final de 2010 apontavam para quase R$ 1 bilhão de gastos efetivos dos Emissores com recompensas e um estoque total de pontos próximo a R$ 6 bilhões)  – e que já não funcionam como diferencial de valor agregado suficiente para garantir aumento de uso e fidelização dos clientes.
Para agravar o desafio, Bancos e Emissores hoje estão focados em melhores resultados e incremento de margens e de lucro. Não há mais espaço para experimentação e investimentos de resultados duvidosos. Qual o retorno dos investimentos em milhagens e recompensas, já incorporados no orçamento de todos os cartões?
Iniciativas internacionais apontam para uma nova tendência, ainda não provada por aqui, mas que certamente terá o seu momento de discussão: para ativar o programa de recompensas, o cliente deverá pagar uma anuidade pelo cartão. Os cartões que não pagam anuidade não farão jus a recompensas. Iniciativas a propósito estão em marcha (como o Citi Simplicity, do Citibank e o novo produto com baixo custo, mas sem recompensas, do Barclays, do Reino Unido).
Nessa mesma direção apontam os resultados de uma recente pesquisa realizada aqui no Brasil pela CVA Solutions, com cerca de 7.000 portadores de cartões (cada entrevistado com 2,2 cartões, em média) em fevereiro: entre estar isento de custos e ter acesso a algum programa de recompensas, o portador de cartão por aqui fica com a primeira: abre mão da milhagem para não ter que pagar anuidade do cartão, por exemplo.
O que dificilmente será sustentável no tempo é o modelo atual de recompensas e milhagens para todos os cartões e todos os clientes, a custos incandescentes  e em incrível trajetória ascendente, que já não garantem os resultados dos cartões na mesma proporção da majoração de seus custos.
Um exemplo de como o mercado deverá se comportar: um inovador programa de troca de pontos por minutagem de telefonia celular pré-paga. Com custos surpreendentemente mais econômicos, a troca de pontos do cartão por minutos pode ser uma excelente alternativa de recompensas, tangível e de facílimo entendimento para os clientes – e muito mais econômica para os Emissores.
Por enquanto, poderá ser um ótimo diferencial competitivo. Na linha do tempo, quando mais e mais Emissores passarem a adotar alternativas como essa, os custos atuais das recompensas serão necessariamente pressionados para baixo.
Em paralelo, um processo de segmentação de benefícios, a exemplo das diversas segmentações de produtos já existentes, deverá fazer com que as recompensas sejam mais assertivamente dirigidas aos clientes de acordo com o perfil de cada um: não faz nenhum sentido a oferta de milhas aéreas para clientes cujos gastos, limitados por suas prórprias linhas de crédito,  por exemplo, não conseguem somar nem um trecho de ida na ponte aérea.
Os tempos são bem outros e, no outrora reluzente universo das recompensas, o que deveria ser uma vantagem competitiva, passou a ser um encargo compulsório para muitos Bancos: uma revolução, por custos mais racioniais e novos diferenciais capazes de produzir vantagens competitivas concretas, está em marcha.
O modelo atual, no formato e nos custos presentes, assim como os cartões afinities de 20 anos atrás, não atende mais a seus propósitos:  resultado e rentabilidade estão em jogo - e nessa arena os Bancos e Emissores não costumam brincar.

quinta-feira, 3 de maio de 2012


AINDA O CADASTRO POSITIVO

Situada no centro do processo de amadurecimento do crédito e do crescimento econômico, a construção do cadastro positivo tem sido uma obra amplamente discutida, debatida e aguardada. Mais do que tudo, aguardada.
Após a aprovação da regulamentação, após intensos debates e enfrentamentos, em 10 de Junho de 2011 pela Presidência da República, o projeto ainda não decolou.
A retomada das discussões sobre o tema neste momento reveste-se da maior oportunidade e relevância, tendo em conta o novo – e definitivo – contexto de redução das taxas de juros em acelerada marcha no mercado financeiro.
Um pouco de retrospecto pode auxiliar no dimensionamento da importância do tema. 
O cadastro positivo, ao contrário de nossa tradição “restritiva”, funciona como um longa metragem onde se desenvolve a vida financeira do cidadão. Bem ao contrário do processo do cadstro restritivo, que funciona como uma espécie de flash de radar de rodovia, quando um veículo ultrapassa o limite de velocidade.
Assim, não importa se o motorista que excedeu em 5% o limite de velocidade e durante 10 anos sempre teve conduta exemplar. O radar lançará a multa por força daquele único episódio desabonador.
Na tradição brasileira de apontamentos restritivos de crédito, é isso o que acontece: o mercado visualiza aquele episódio desabonador, visualiza a multa. O histórico do condutor – há quanto tempo dirige, quanto trafega por mês, quantas renovações bonificadas obteve em seu seguro por ausência de sinistros etc – nada disso existe no universo oficial do cadastro restritivo.
Apenas aquela multa, único desvio momentâneo em sua vida de motorista. Mas, transportando o conceito, por esse critério, caso a carteira de motorista fosse um contrato de crédito, esse cidadão não poderia ter sua carteira de motorista renovada.
No longa metragem do cadastro positivo, ao contrário, toda a história de direção segura, bonificação de seguros e condução disciplinada estaria gravada e valorada no momento da renovação da carta – ou, transportando para o nosso contexto – a concessão do crédito.
Por que é tão importante esse longa metragem?
Porque através dele as instituições financeiras conseguem determinar a quantidade de crédito que um cliente pode receber com segurança. O valor e o preço do empréstimo que cada cliente pode receber e terá condições saudáveis de pagar, sem comprometer sua própria saúde financeira e sem gerar risco grave de não pagamento.
De posse dessa ferramenta, o mercado financeiro pode melhorar a qualidade do crédito ofertado. Em poucas palavras: pode corroborar e acelerar a redução das taxas de juros.
Muito além de polarizações políticas ou ideológicas, acerta a economia que consegue trabalhar saudavelmente com taxas de juros menores. Desde que devidamente atribuídas aos clientes, respeitados os critérios de capacidade de pagamento versus risco de crédito.
Não é excessivo agregar que, no primeiro trimestre de 2012, o volume de aprovação de crédito para aquisição de veículos passou a 50% do total das solicitações, despencando de 70% do ano anterior, porque a conta da inadimplência pesou muito acima do esperado no final de 2011.
Não existe mágica. Se a instituição financeira não consegue ter a segurança e a garantia necessária ao crédito, não haverá crédito.
Outra vez: o movimento de redução de taxas de juros (a essa altura já não apenas tendência, mas movimento efetivamente em marcha) é, sobre todos os aspectos, louvável e desejável.
Mas as condições de viabilidade devem estar presentes. Ou o debate atual, de resto bem intencionado, não passará de bravata.
Dentre essas condições, reassume decisiva relevância o cadastro positivo. Conhecer os clientes e ter acesso a seu comportamento e histórico de pagamentos é fundamental para a concessão madura – e de menor risco – de crédito.
Não por acaso em economias que adotam o produto o volume de crédito é superior a 100% do PIB – e por aqui ainda 49%, que hoje celebramos, porque há cinco anos o volume era ainda metade desse.
Crescemos e evoluímos em praticamente todos os indicadores econômico-sociais, incluindo os de utilização de crédito. Mas ainda há um longo e respeitável caminho a percorrer. De resto, todo o mundo já percebeu isso e está chegando por aqui, com inédito apetite de negócios, à espreita e na aposta de que saberemos dar os próximos saltos qualitativos na consolidação de uma economia moderna e madura.
Parte disso é, sem dúvida, o desencalhe do cadastro positivo. O debate sempre subjacente durante a formulação regulatória, entre o interesse público (expansão do crédito) e os limites da privacidade (sigilo das informações) deve agora passar ao próximo nível.
Com maturidade e seriedade, não será difícil entender que o compartilhamento de informações beneficiará a todos e sobretudo aos próprios cidadãos, que serão premiados com melhores produtos e serviços, melhores ofertas e menores taxas de juros.
Os agentes e a habilidade técnica para gerir e desenvolver esse negócio já estão a postos – e confiantes. Talvez ainda não nos tenhamos dado conta, mas o único país em que os 3 maiores bureaus de crédito do mundo – Experian (Serasa), Equifax (que, em associação com a Associação Comercial de São Paulo originou o grupo Boa Vista) e TransUnion (que recém aportou no país com a aquisição da Crivo), estão presentes, além do seu país de origem, os Estados Unidos.
Pode parecer pouco, mas não é. O mercado e os cidadãos estão confiantes. É hora de desatar os nós e ingressar, de uma vez, no primeiro mundo da economia.
Menos radares amoitados na beira da estrada.  No crédito, como na política e na vida: honestidade, franqueza e transparência – nossa história não pode ser o resultado de um flash fortuito de radar: temos um  longa metragem a apresentar.

TRÊS É DEMAIS?

O Brasil passou a ser, a partir desse ano, o único país do mundo fora dos Estados Unidos em que os 3 maiores bureaus de crédito estão presentes: Experian (Serasa), Equifax (que, em associação com a Associação Comercial de São Paulo originou o grupo Boa Vista) e agora, também a TransUnion (que recém aportou no país com a aquisição da Crivo, especializada em ferramentas de automação de crédito).
Com configurações e modelos de negócios próprios e não necessariamente idênticos ao modelo da matriz, o fato é que estão – todas - no Brasil.
Com participação ainda inferior a 50% do PIB (49,1% em 2011),  ao passo que nos Estados Unidos já supera 200%, o volume atual de crédito (cerca R$ 2 trilhões) pode parecer não comportar todos os concorrentes, especialmente se comparados ao mercado norte-americano, onde competem por algo em torno de U$ 30 trilhões.
A decisão estratégica de expansão de negócios, com o Brasil à frente das demais alternativas na geografia contemporânea, de resto, segue a tendência de praticamente todos os segmentos de negócio: o Brasil é hoje o objetivo de chegada de 9 em 10 investidores internacionais.
No entanto, a presença dos grandes agentes na arena de informações de crédito merece atenção especial, até porque não encontra paralelo em nenhum outro país.
A parte as condições objetivas de negócio ante as perspectivas de crescimento em um cenário sócio-econômico estabilizado (apesar das ainda pouco competitivas condições de infra-estrutura, encargos tributários e burocracia), a capacidade de consumo do cidadão brasileiro aumentou e todo o mercado está à busca de crédito para alavancar o crescimento da economia.
Recentemente, não sem razão, o crédito entrou na pauta da agenda política e passou a ser assunto de governo. O raciocínio é lógico: em economias desenvolvidas, o crédito é um fator de desenvolvimento econômico e social e sua expansão é crítica para acompanhar – e sustentar -  o ritmo de crescimento do país.
Não é segredo para ninguém, nem para o governo, nem para os agentes financeiros, nem para o próprio consumidor, que o uso inconsequente ou abusivo do crédito pode ser pior do que a sua escassez. Ainda ressoam os ecos da grande crise das hipotecas de 2008 para que ninguém se esqueça de quão crítica é a questão.
E por aqui, picos de inadimplência, como especialmente da segunda metade de 2011, acionam o sinal amarelo para novos empréstimos e o sinal vermelho para a necessidade de correção de rumos – ou seja, concessão e monitoramento mais criteriosos.
E não será em um arremedo de redução de taxas que solucionaremos o problema. A constituição de um processo maduro para expansão de crédito requer muita consistência de informações, ferarmentas e tecnologia, além do estímulo ao consumidor, entusiasmado com a novidade de seu novo patamar de consumo – e incentivado por taxas reduzidas. Sem as condições estruturais de um processo robusto, a redução das taxas será, na melhor das hipóteses, mera bravata.  E na pior, um risco irresponsável.

Aí justamente é que passamos ao próximo nível dessa discussão. A expansão do crédito – de resto uma realidade em marcha e uma oportunidade extraordinária, face ao ritmo de crescimento do país – deve estar suportada e amparada por informações e ferramentas de qualidade, com agilidade de autalização de informações e sobretudo, inteligência para tomada de decisão.
A informação é a base para a tomada de qualquer decisão. E todos sabemos que ainda temos uma avenida imensa a percorrer – não temos ainda dos dados de informações positivas, dos dados de hábitos de consumo e de pagamentos dos consumidores, que serão consolidadas pelo cadastro positivo, ainda bastante longe de ser uma realidade operacional.
E embora essencial e condição absolutamente necessária, a informação (ainda precária) já não é condição suficiente: precisamos de inteligência aplicada e ferramentas de decisão. Que partem, naturalmente, das informações, mas representam o próximo passo fundamental para a estruturação de modelos robustos de concessão e controle de crédito, sem os quais não há como expandir a base de empréstimos.
Não é pouco trabalho assim como, claramente, não é pequeno o tamanho da oportunidade. Os grandes bureaus perceberam isso e passam a ser agentes fundamentais e muito bem vindos da construção dessa nova etapa de desenvolvimento no país, com sua experiência e tecnologia capazes de nos auxiliar a capturar a imensa oportunidade de expansão que está à nossa frente – de maneira responsável e sustentável.


O DESAFIO DA REDUÇÃO DOS JUROS PARA O CRÉDITO AO CONSUMIDOR E O NEGÓCIO DE CARTÕES


Na semana passada BB e Caixa anunciaram e iniciaram oficialmente uma política de cortes fulminantes nas taxas de juros ao consumidor, transformando em movimento concreto aquilo que já se prenunciava como tendência há bastante tempo.

Seja por força da agenda político-econômica que recentemente ganhou força definitiva no Planalto, seja pela tendência apontada pelos mercados de economia estável e cultura de crédito arraigada, a redução das taxas de juros ao consumidor é um tema em pauta e nas agendas dos executivos financeiros há mais de uma década.

O terreno vem sendo preparado, com modelos, ferramentas e políticas sociais que, em primeiro lugar, criaram condições para a expansão do crédito como matriz de desenvolvimento e crescimento sociais, resultando em uma nova relação crédito / PIB, inédita em nossa economia de 49,1% em 2011, correspondente a mais de R$ 2 trilhões em crédito total concedido (não custa lembrar que até 2005 essa relação era de apenas 26%).

A ampliação da base social de consumo -  graças à prodigiosa expansão da classe C, especialmente nos últimos 5 anos, efetivamente possibilitou a geração de um novo cenário de compras e consumo, em grande medida também feito possível justamente pela estruturação e proliferação da oferta de crédito - criou um novo mercado consumidor, que passa a entender que pode comprar e que pode ascender socialmente, com as novas ferramentas que tem à disposição. Essa nova massa de cidadãos passou de 62 milhões de pessoas (34% da população, quando o segmento D/E era 51%) para mais de 103 milhões (51% da população, quando a classe D/E, de onde emergiram, felizmente encolheu para 24% da sociedade).

Esse novo consumidor, como aponta, entre outros dados, a competentíssima pesquisa “Observador Brasil” edição 2012, do grupo Cetelem, realizada pelo instituto Ipsos – já está mais maduro e reflete consistentemente as oscilações da economia. Em 2011, embora ainda predominantemente muito otimista sobre o país e a economia, o seu entusiasmo já é menor que o do ano anterior, quando se operou a maior propulsão de crédito e consumo.

O consumidor nacional, segundo a pesquisa, considera que a economia estará estável em relação ao ano anterior. E, ao mesmo tempo, está rigorosamente dividido sobre a sua expectativa em relação aos juros do país: metade acha que as taxas serão reduzidas e a outra metade não acredita em reduções significativas.

O que se torna especialmente interessante quando confrontado com a informação de que, segundo análise do professor Luis Carlos Mendonça de Barros publicada na Folha de São Paulo neste final de semana, a reação dos consumidores neste início de ano tem sido a de primeiro pagar suas dívidas e só depois voltar a comprar. O que, além de representar um eloqüente alento após a forte alta dos níveis de inadimplência do último ano, também sinaliza que o consumidor aprendeu e amadureceu muito rapidamente. E nada indica que ele retornará afoito a um endividamento acelerado.

O mesmo Observador Brasil apurou que há mais renda disponível em todas as classes sociais: na classe C, por exemplo, a renda disponível (livre para gastos de qualquer natureza, após o cumprimento das obrigações mensais) cresceu 50% sobre o ano anterior. Além disso, os consumidores acreditam que a oferta de crédito irá crescer / melhorar (49%). Mas não há euforia em relação aos juros (1/3 da população acredita que irão piorar, 1/3 acredita que ficarão inalterados e 1/3 acredita que poderão melhorar).

Nesse contexto, tudo somado, um novo mercado de consumo está pavimentado. A nota destoante, sob quaisquer argumentos e quaisquer variantes, segue sendo a elevadíssima taxa de juros. Parece ter chegado o momento de finalmente enfrentarmos esse capítulo.

Não é assunto que se resolva por decreto, é certo, mas o movimento iniciado nesta semana pelos Bancos federais torna o tema, que sempre foi importante e relevante, agora também candente e urgente.

Uma coisa é certa: esse movimento inaugura um dos períodos mais intensos de competitividade e pressão por resultados e alternativas de gestão no varejo financeiro em muitos anos.

Os Bancos estão equipados e são extremamente sérios para entender a dimensão do desafio, mas demandam condições coerentes de competitividade: não há como não serem revisitados os gargalos tributários e regulatórios que estrangulam as margens dos Bancos se, de sua parte, também o governo estiver disposto a encarar a questão com seriedade.

Um corte abrupto, imediato e com a intensidade anunciada das taxas de juros não é compatível com um contexto de competitividade saudável. Não apenas a inadimplência segue como grande preocupação (e ferramentas como o cadastro positivo, por exemplo, ainda não oferecem o grau de maturidade requerido para reverter esse cenário), como a oneração regulatória e fiscal extraem capacidade competitiva fundamental para pavimentar uma queda sustentável dos juros.

Que as taxas irão cair, ninguém duvida. O tema não é novo, afinal. Em meu livro “E o dinheiro virou plástico”, Ed Cultura, publicado no ano 2000 (há mais de uma década, portanto), já apontávamos para essa tendência e os desafios que a indústria, por exemplo, de cartões de crédito, teriam pela frente com essa variável, cedo ou tarde, no front. Aquilo que apontávamos como tendência, agora já se tornou movimento. Assunto em marcha. A questão é a maneira e o momento.

Em todo o varejo financeiro nacional, as receitas com as operações de crédito são prevalentes e determinantes da rentabilidade dos Bancos. Não por acaso, as ações dos principais Bancos recuaram imediatamente após o anúncio do corte das taxas em Brasília. Crédito pessoal com gênero e, sobretudo, cheque especial, como espécie, têm papel preponderante na composição das receitas de todas as operações bancárias ao consumidor – mesmo aquelas voltadas à alta renda.




A queda abrupta das taxas é um golpe significativo em todo o mercado. Não que isso deva ser segredo para o Banco Central. Daí exatamente a questão ser mais interessante: o BC sabe (assim como o Ministério da Fazenda) da potencial dimensão depreciativa de valor para as instituições financeiras de um corte abrupto das taxas. Mas ainda assim acelera a sua implementação nos Bancos oficiais. É uma sinalização clara de direcionamento. Mas falta o ajuste fino. E aí é justamente que começam os desafios dos gestores, as  rodadas de negociações e as lições de casa para toda a cadeia produtiva.

Algumas pistas serão de imensa importância para o direcionamento dos trabalhos de todos nós, gestores e responsáveis pelo desenvolvimento e crescimento sustentáveis das diversas operações de financiamento ao consumidor do mercado nacional.

O nosso mercado de cartões de crédito tem 58% de suas receitas provenientes do crédito rotativo, hoje dentre os principais alvos de corte de taxas no crédito ao consumidor (último relatório cartões Bacen, dezembro 2010). Um corte hoje de mais da metade do valor das taxas pode corresponder a inviabilizar muitas operações de cartões, da maneira como estão constituídas.

Com décadas à nossa frente, o mercado norte-americano, recém emergindo da crise de 2008-2009, vem há anos em um movimento de análise de reengenharia e novas fontes de receita para os cartões, uma vez que o extraordinário grau de competitividade do mercado encarregou-se por si próprio de reduzir sumamente as taxas de juros na busca por novos clientes e, claro, veio dizimando grande parte das suas receitas nas duas últimas décadas.

O conceito de “intelligent pricing” vem sendo intensamente debatido e incentivado nesse período como alternativa de recompor as receitas que, por força da competitividade de mercado, foram reduzidas com baixíssimas taxas de juros.

Cobrar em função do perfil do cliente, do perfil de uso dos cartões (conceitos como tarifa por inatividade de cartão), perfil de risco (derivando em taxas de juros flexíveis e variáveis em função dos scores dos clientes).

O percentual de participação de tarifas (“fees”) nas receitas dos emissores de cartões nos Estados Unidos chegou a 48% em 2010, subindo de 31% de uma década atrás (The Wall Street Journal, 23 de janeiro de 2011, Marketwatch, A New Landascape for Credit Cards, Jennifer Waters), conforme as tendências e estratégias de gestão perseguidas pela indústria local. O balanço é claro: juros menores, tarifas (INTELIGENTES) maiores.

No Brasil, a participação das tarifas na receita dos cartões está na casa de 13%, contra quase 60% das receitas com financiamento (relatório cartões Bacen, dezembro 2010).

Sem adernar à arena do marketing, estamos falando de segmentação. Mas, sobretudo, estamos e estaremos falando de estratégia. No caso específico dos cartões, por exemplo, tudo recai e remonta à essência do principal pilar do negócio: fazer com que o cliente USE o SEU cartão. Quanto mais usar, mais poderá financiar. Quanto menos usar, menos receitas trará. Como fazer isso é um desafio cada vez mais presente e premente em nossa gestão. Por exemplo: cartões inativos, ou de baixa atividade, são tarifados, ou mais tarifados, incentivando os clientes à utilização do produto ou, gerando receita compensatória pela falta de uso, através de um sistema segmentado e inteligente de precificação.

Novas alternativas incluem segmentação mais rigorosa na composição do produto para suportar taxas menores, endereçando públicos específicos com perfil prevalente de utilização do crédito rotativo. O Barclays está lançando neste trimestre um novo produto, o BarclayCard Ring, com as menores taxas de rotativo de seu portfólio, isenção de anuidade, mas SEM nenhum programa de recompensas agregado. A mesma estratégia e mesma configuração norteou o Citi Simplicity, lançado no ano passado (Lowcards.com, 7 de Março de 2012, Lynn Oldshue).

Público segmentado, menores taxas, mas com menos prêmios e recompensas na outra ponta. É um desenho, dentre infinitas outras possíveis composições, de viabilização do negócio. Mais do que nunca, planilhas, calculadoras e criatividade deverão andar juntas.

Competitividade e diferenciação, definitivamente, será o nome do jogo.

Mais pistas, também do mercado americano: clientes estão adorando os cartões com cash back (um percentual de todos os gastos volta como crédito no cartão) e, como sempre, apontam a excelência no atendimento e na execução do serviço como fatores preponderantes na escolha de uso do produto.

Outra tese em curso é a de se atrelar programas de recompensas (de resto, sobretudo os de milhagem, com custos atuais exorbitantes na operação da maioria dos Bancos emissores) apenas aos cartões que paguem anuidade. Mais, os níveis do programa de recompensas passam a ser associados ao nível de anuidade efetivamente paga pelo cliente.

Dentre as principais causas de insatisfação e cancelamento dos cartões, lá como cá, léguas à frente do segundo lugar... a alta taxa de juros. Agregue-se a informação de que no BB e Caixa, o perfil de risco dos clientes – um dos principais argumentos para a sustentação das taxas de juros elevadas – é em sua maioria (55%) de alto risco (segundo as faixas de risco do Bacen, de B a H), enquanto nos Bancos privados 75,9% dos clientes pertence ao perfil de risco AA – A, o mais baixo do mercado, conforme as faixas do Bacen.

A contradição, neste momento, pode jogar contra a tese de que o mercado precisa da gordura das taxas para compensar os maus pagadores.  A verdade é que, em melhor técnica, praticar taxas mais baixas e clientes com piores scores é um risco altíssimo, que o mercado não pode carregar.

Com efeito, outra tendência em marcha acelerada nos novos modelos do mercado americano, é distanciar ainda mais marcadamente as taxas dos clientes de maior risco (que irão subir), das taxas dos clientes de menor risco (que serão, estes sim, recompensados por taxas menores). Dentre as melhores práticas atuais de gestão, muitos Bancos já praticam esse modelo no Brasil. É de se aprofundar a prática. E são de  preocupar movimentos de precificação em sentido contrário.

No final do dia, melhores pagadores e menores taxas, propulsionarão crédito, que por sua vez alavancará o consumo, que propiciará crescimento sustentável de longo prazo ao país, que é tudo o que todos nós queremos.


Por enquanto, o dia amanheceu mais difícil para toda a indústria. Há lição de casa para todos os elos da nossa cadeia produtiva.

Mas o desafio vale à pena. Entramos, finalmente, na era da maturidade do crédito ao consumidor. Bom para o mercado, ótimo para o país.

terça-feira, 1 de maio de 2012


A BUSCA DA FELICIDADE

O genial Oscar Wilde declarou sobre o dinheiro que “não traz felicidade, mas a diferença é tão pequena que é preciso um especialista para dizer”...

Pois parece que já temos os especialistas.

Recentemente, várias são as iniciativas que buscam pontuar e quantificar (se é que isso é possível) os níveis e graus de felicidade dos cidadãos estatisticamente.

Partindo de premissas econômicas e de desenvolvimento social, diversos estudos recentes têm buscado detalhar os níveis de felicidade da população.

Uma das iniciativas mais interessantes nesse sentido é, sem dúvida o FIB (algo como Felicidade Interna Bruta), sucedâneo do PIB, desenvolvido na década de 1970, consta que em 1972, no Butão, diminuto reino asiático com cerca de 700 mil habitantes, situado na região do Himalaia, a 3.000 de altitude, entre a China e a Índia (que viria a ser a inspiração para o reino perdido e perfeito de Shangri-lá, na obra de 1933 do britânico James Hilton, Horizonte Perdido) – e que hoje avalia, mede e aplica esse índice com tanta ou maior atenção quanto o próprio PIB. Ou mais: lá há o Ministério da Felicidade cuja missão é especificamente monitorar esse índice. Brincadeira? Não, felicidade por lá é coisa séria. Como de resto, aliás, nada deveria ser mais sério, em qualquer latitude.

Os princípios norteadores do FIB são descritos como: desenvolvimento econômico sustentável, preservação da cultura, conservação do meio ambiente e boa governança.

Recente pesquisa levada a campo pelo Governo butanês, revelou as prioridades apontadas pela população como essenciais para a composição da felicidade, que podem ser consideradas, por assim dizer, os desdobramentos operacionais daqueles princípios norteadores:  Segurança financeira, Acesso a estradas pavimentadas, Educação, Saúde, Bom relacionamento familiar. Em tempo: tomado estritamente pelo critério econômico, o Butão é um país pobre, com PIB menor, por exemplo, que o do município de Aracaju.

Para os que, como nós, não estamos habituados, esse modelo de avaliação de bem-estar social, de ambição holística, pode soar mero diletantismo, quase jocoso, no meio dos índices econômico-financeiros tradicionais, através dos quais oficialmente medimos nossos níveis de desenvolvimento e progresso.

A boa notícia, entretanto, é que a FGV está desenvolvido o FIB nacional. Inspirado no mesmo conceito do índice original, será constituído a partir de critérios e indicadores que levam em consideração aspectos relevantes ao bem-estar da população brasileira.

Os elementos balizadores do novo índice a serem utlizados como critérios da medição: Segurança, Saúde, Educação, Distribuição de Renda, Salários de homens e mulheres, Desigualdade Social, Expectativa de Vida, IDH (o índice de desenvolvimento humano em que o país consta hoje na 84ª. posição....), além do próprio PIB.

Um rápido parêntesis para dimensionarmos o tamanho do desafio – e da importância desse novo indicador, de ser levado muito a sério: a assimetria colossal entre o PIB e o IDH.

O Brasil é hoje a 6ª. economia do mundo, com um PIB de US$ 2.492 trilhões. Noves fora que a última previsão do FMI recoloca o Brasil atrás do Reino Unido no final de 2012, com US$ 2.417 tri contra estimados US$ 2.449 da atual 7ª colocada, com US$ 2.452 tri do fechamento de 2011. É um desempenho que assegura ao país posição no pelotão de frente da economia global, o que já é um dado em qualquer forum atual, especialmente se ainda considerarmos a proximidade para o 5º posto, a declinante França, com pouco mais de US$ 2.7 trilhões...

O que torna ainda mais espantosa a pífia 84ª posição atual em IDH (ainda que um posto à frente do ano anterior), mais especialmente ainda quando o ranking nos classifica na 20ª posição dentro da América Latina, atrás de titãs da envergadura de Barbados, Uruguai, Trinidad e Tobago, Antigua e Barbuda, Panamá e Cuba...

O IDH parte de 3 premissas fundamentais: expectativa de vida ao nascer (de onde se inferem os inúmeros desdobramentos naturais de qualidade de vida), educação (acesso ao estudo e conhecimento) e PIB per capita (ou, em bom português, distribuição de renda e justiça social).

A extraordinária coincidência de critérios que irão valorar o novo FIB com o IDH são um alento importante para que o país consiga perseguir os  níveis dos países que conseguem refletir, em suas economias, qualidade e satisfação de vida para sua população.

A esse propósito, aliás, inúmeros estudos recentes têm insistido em apontar uma incômoda assimetria – e, a partir de um certo ponto, completa dissociação - entre riqueza e felicidade, bem ao contrário dos cânones pelos quais muitas vezes pautamos nossas vidas profissionais, especialmente dentro da corrida executiva e corporativa.

Em suculento artigo publicado recentemente pelo Valor Econômico, o professor André Lara Resende (“Bem-estar e húbris”) cita pesquisa recente nos Estados Unidos para o Índice de Bem-Estar Gallup-Healthways, realizada através de observação diária de 1.000 pessoas e 450 mil respostas, que identificou que a partir de um determinado nível de renda em que condições de dignidade e inclusão sociais estejam garantidas, mais dinheiro não representaria mais satisfação, nem maior bem-estar.

E chegaram ao nível de encontrar um número: US$ 75 mil dólares de renda anual para uma família média padrão, para as áreas onde o custo de vida é alto, podendo variar, para baixo, em regiões de custo de vida mais econômico.

O dado e a conclusão são impressionante, porque desafiam extraordinariamente um paradigma quase inconsciente que costume mover – e acelerar – o mundo profissional, segundo o qual, quanto mais riqueza (e, portanto, maiores postos nas organizações, maior velocidade de ascensão na carreira etc), maior será o nível de satisfação pessoal e, por tabela, de felicidade.

Poucas vezes paramos para questionar a que custo. A que custo tanto crescimento, tanta progressão profissional, tanta volúpia de acumulação... À luz de descobertas como essa, será que não poderiamos arriscar e dizer: ao custo de nossa própria felicidade?

Não poderia haver argumento e momento melhor para reflexão. Quanto de qualidade real de vida estamos trocando e barganhando, quando não negligenciando, em troca de uns trocados a mais? Que ao final, ao contrário do senso ordinário difuso até agora, não trarão mais felicidade?

Brincadeiras à parte, por mais que possamos brindar à fina ironia de Oscar Wilde, esse é um assunto seríssimo. Porque – e muito possivelmente não por acaso – toda nossa riqueza nacional acumulada de 6ª maior economia do mundo (PIB) não reflete qualidade e bem-estar da população (84ª posição no IDH), assim como talvez, toda a nossa sofreguidão por mais riqueza pessoal esteja, ao contrário do que imaginamos, justamente jogando contra nosso próprio nível de satisfação e felicidade pessoal.

Com muito entusiasmo saudamos o novo índice FIB, para nos auxiliar a auferir a quantas anda nossa felicidade enquanto nação. Não poderia haver melhor oportunidade para pensarmos – seriamente – no assunto, também na esfera pessoal.