segunda-feira, 23 de abril de 2012


A CEREJA E O BOLO

A perseguição de diferenciais e atrativos de valor agregado é ponto crítico dentre os desafios de qualquer negócio contemporâneo.
Do sofisticado mercado financeiro ao mais prosaico segmento de comércio, o nome do jogo é diferenciação para atrair e reter os melhores clientes.
Pois é de uma pizzaria da Coréia que chega a notícia de um interessantíssimo diferencial, cuja notícia correu o mundo nos últimos dias.
Um novo cardápio com tecnologia de ponta, permite ao cliente tocá-lo sobre o sabor eleito da pizza para comandar seu pedido. A pizzaria então recebe a mensagem eletronicamente e retorna uma mensagem de texto SMS ao cliente, para confirmação da ordem. Uma verdadeira, por assim dizer, pizza cibernética.
Não surpreende que a notícia venha da Coréia que, de maneira exemplar, consagrou-se em uma invejável posição de inovação e liderança tecnológica, após de décadas de investimentos continuados, estrategicamente definidos como políticas de estado, em Educação.
De resto, é uma inovação essencialmente de aproveitamento de técnicas de inovação tecnológica.
Honestamente, achei a novidade muito interessante. É, sem dúvida, um diferencial inovador.
Após fazer coro aos animados comentários dos analistas que tratavam a notícia, como uma diferenciação capaz de atrair e reter os clientes pela comodidade, conveniência e pelo próprio sabor da novidade, voltei-me para minha experiência de consumidor, tratando de imaginar a novidade transposta para a minha própria cesta (respeitável, diga-se) de cardápios de entrega de pizza.
Como poderia ser interessante olhar para a foto desse novo cardápio, clicar sobre ela e imediatamente ter meu pedido enviado e processado pela pizzaria. Então pensei que, de fato, a novidade, de fato, poderia me atrair à primeira compra. Quanto mais não fosse, por curiosidade e pelo inusitado, conclui que gostaria de experimentar o sistema.

Mas e depois? E se a pizza não fosse boa?...
Não haveria novidade teconologica ou diferencial de atendimento que pudesse substituir, superar ou corrigir a falta de qualidade do produto objeto do consumo, no caso a pizza. No fundo e antes de mais nada, o que tem que ser bom é o produto, em sua essência característica. A pizza tem que ser boa! Não é por conta de um diferencial fundamentalmente perifério à sua essência (ou seja, que não tem nenhuma relação com a efetiva qualidade da própria pizza) que serei levado a consumí-la.
Parece óbvio e talvez mesmo por isso muitas e tantas vezes os aspectos básicos, essenciais e característicos dos produtos são negligenciados, descuidados, esquecidos, enquanto criamos mirabolantes diferenciais – periféricos.

Desde que a corrida frenética pela competição no varejo financeiro e no mercado de cartões começou – no Brasil, notadamente, após a estabilização da moeda, na segunda metade da década de 90, mas nos Estados Unidos, por exemplo, já a partir da década de 80 – temos dedicado significativa parcela de tempo, recursos e investimentos à busca de diferenciais competitivos.
Todas as novidades de última hora passaram a interessar e a mobilizar nossa gestão para viabilizá-las e implementá-las.
O negócio de cartões tem sido especialmente pródigo nesse capítulo. Tantos são os benefícios, prêmios, recompensas e que tais, que a maoria dos clientes não conhece (e tanto menos utiliza), nem a metade.
Desde a virada da década de 1990 para 2000, quando percorriamos os Bancos da América Latina com os projetos de consultoria e melhores práticas da Visa Internacional, ante audiências ávidas pelas últimas novidades dos Estados Unidos em diferenciais, benefícios e recompensas, apresentavamos a conclusão dos estudos mais recentes que, ao invés de orientar a novidades, trazia uma resposta supreendente: o que os clientes mais desejam em seus cartões É QUE ELES FUNCIONEM.
Nem mais, nem menos: que funcione. No caso da pizza, que seja boa. No caso dos cartões, que sejam aceitos na hora da compra, sejam aprovados no ponto de venda, tenham suas faturas emitidas corretamente e entregues no prazo e suas cobranças devidamente processadas e liquidadas.
Só isso? Não. Mas sem isso, nenhum diferencial fará a satisfação – e a fidelização - dos clientes.
Tendo isso em conta, porque o postulado permanece mais válido do que nunca, é muito importante que nossos recursos, tempo e investimentos estejam aderentes e coerentes com a solidez e qualidade das funcionalidades essenciais de nosso produto, de suas características fundamentais. Uma boa e saborasa pizza é fundamental para o sucesso do negócio. Condição talvez não suficiente, mas condição absolutamente necessária. Já a forma de solicitação inovadora não é essescial, não é definidora do hábito do consumidor – e nunca será, a menos que a essência do produto (a pizza), tenha qualidade.
No caso do varejo bancário e dos cartões, dentre os atributos essenciais e fundamentais está, por exemplo, o atendimento. Será que podemos dizer com segurança que atingimos o estado de excelência nesse quesito? Vale refletir sobre isso: não há milhagem, promoção, desconto e propaganda capaz de reverter uma má experiência de uso e de atendimento.
Em que pese a enorme pressão por inovação e diferenciais, a máxima permanece verdadeira: não é a cereja, mas o bolo que interessa.

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